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María del mar Trejo Pérez

Conselheira Eleitoral do Instituto de Participação Eleitoral e Cidadã de Yucatán (IEPAC). Mestre em Ciências da Educação, Diplomada em Direitos Humanos dos Povos, Comunidades Indígenas e Afro-mexicanas e em Violência Política Contra a Mulher com Base no Gênero. Bacharel em Direito e Bacharel em Educação Infantil. Membro da Associação Mexicana de Conselheiros Eleitorais Estaduais, A.C. (AMCEE), a Rede Nacional de Conselheiras Eleitorais para uma Democracia Inclusiva (RENACEDI) e a Rede de Mulheres Líderes das Américas. Associada CAOESTE.

Antecedentes

Em 13 de janeiro de 1916, no Teatro Peón Contreras da cidade de Mérida, Yucatán, foi inaugurado o Primeiro Congresso Feminista no México. Durante quatro dias, 617 mulheres de diferentes estados da República Mexicana estiveram nesse recinto. No fórum, foram discutidos quatro temas apontados na convocatória emitida, nesse momento, pelo general Salvador Alvarado, que foi governador de Yucatán. Esse Congresso foi presidido por Matilde de Paullada e participaram, entre outras, Aurora Molina, Hermila Galindo Carranza, Elena Torres, além de Amparo Evia, Josefa Osorno, Candelária Torres, María Concepción Muñoz e María de la Luz Escalante.

Esse Congresso foi significativo na história do país, porque estabeleceu as bases da luta pelos direitos das mulheres mexicanas:  foi o precedente para que no Congresso Constituinte de 1916-17, o direito ao voto ivo e ativo das mulheres fosse proposto, o que, como finalmente se sabe, não foi incorporada na época à Constituição Geral, até 1947 no âmbito municipal e em 1953 a nível nacional. Além disso, nesse Congresso foram discutidas questões sobre a libertação econômica, social e política das mulheres, de modo que o Congresso definiu para a história e para a legislação mexicana processos significativos de inclusão social e legal para as mulheres em Yucatán, mas que tiveram um impacto nacional.

Como mencionam Alejandre e Torres (2016: 86), ela teve que enfrentar resistência para mudar até mesmo entre as próprias mulheres, pois estavam em um processo de reconhecimento de seu status de cidadania plena. Também é necessário destacar a tenacidade das mulheres que conseguiram o voto ivo em Yucatán, com a eleição como deputadas de Elvia Carrillo Puerto, Beatriz Peniche e Raquel Dzib, e como vereadora Rosa Torre (Rosado, 2018: 188).

 Ecoando a história do Primeiro Congresso Feminista, a Associação Mexicana de Conselheiras Eleitorais do Estado, A.C. (AMCEE), a Rede Cívica Mx, a Rede Nacional de Conselheiras Eleitorais para uma Democracia Inclusiva (RENACEDI) e as Constituintes Mx, co-convocaram mulheres mexicanas que desejavam participar do Primeiro Congresso de Mulheres Políticas, realizado em 8 de setembro de 2021 em Mérida, Yucatán, no mesmo lugar emblemático que é o Teatro Peón Contreras e no âmbito da comemoração do Dia Internacional da Cidadania das Mulheres.   Mais de mil e seiscentas mulheres de diversos espaços da vida pública, mulheres tomando decisões transcendentais no México, se reuniram naquele evento, como aconteceu há 105 anos, mas desta vez para abordar quatro questões fundamentais: paridade transversal de gênero, erradicação da violência política contra a mulher baseada em gênero, 3 de 3 contra a violência contra a mulher e construção da cidadania das mulheres.

 Marco legal

 O marco legal que regulamentou as questões discutidas no Congresso foram convenções e tratados internacionais, como, por exemplo, o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos; a Convenção sobre os Direitos Políticos das Mulheres, a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres (CEDAW); a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher (Belém do Pará) e a Plataforma de Ação de Pequim.

A nível nacional, a base jurídica encontra-se na Constituição Política dos Estados Unidos Mexicanos (EUM), que reconhece a Paridade de Gênero como princípio democrático, bem como a reforma eleitoral de 13 de abril de 2020 sobre Violência Política contra as Mulheres em Razão de Gênero. Ressalta-se que o Acordo CG/51/2020, emitido pelo Conselho Geral do Instituto Nacional Eleitoral (INE), pelo qual as Diretrizes foram aprovadas para que os partidos políticos nacionais e locais incorporassem os critérios da iniciativa denominada “3 de 3”, a mesma que consiste no fato de que nenhuma pessoa pode ser candidata a um cargo eleito popularmente quando tem um registro de denúncia, investigação, acusação e/ou sentença executória como candidata:

  1. Devedor de pensão alimentícia,
  2. Agressor sexual, incluindo acosso e assédio sexual, e
  3. Agressor contra as mulheres por razões de gênero no ambiente familiar.

 É importante notar que a América Latina está a caminho da inclusão igualitária das mulheres nos processos democráticos, independentemente das ideologias que estão em jogo, por isso os sistemas eleitorais devem garantir a participação igualitária das mulheres nas eleições (Bareiro e Soto, 2019: 756)

 Desenvolvimento do Congresso

 Estar sentado onde estava Elvia Carrillo Puerto, onde estava Hermelinda Galindo, e onde estavam as mulheres que abriram a brecha para as mulheres, nos leva a lembrar e continuar a luta iniciada por elas. O Teatro Peón Contreras, com seus múltiplos usos como centro cultural e de performance na metrópole Yucateca, também lembra como as mulheres se reuniram na segunda década do século XX para lançar as bases da luta por seus direitos e para afirmar sua dignidade como seres humanos. No século XXI, essa luta continua. No século XXI, essa luta continua. Nenhum regime que se diga democrático o pode ser, sem a participação substantiva das mulheres, em igualdade de condições e livre de todos os tipos de violência.  Para isso, é essencial cumprir as responsabilidades convencionais e constitucionais das instituições do Estado mexicano para promover, respeitar, proteger e garantir os Direitos Humanos, incluindo os Direitos Políticos e Eleitorais das Mulheres, bem como o princípio da coresponsabilidade de prevenir, atender, punir e erradicar todos os tipos de violência que violem sua integridade, seus direitos e liberdades.

O Congresso das Mulheres Políticas foi um evento histórico.  Devido às circunstâncias da pandemia, foi realizado de maneira presencial e virtual. A parte presencial foi no memorável Teatro Peón Contreras. Legisladoras locais e federais eleitas e demissionárias, senadoras, governadoras atuais e eleitas, prefeitas, membros e conselheiras sindicais, ativistas, acadêmicas, coletivas, conselheiras eleitorais locais e federais, magistrados eleitorais locais, regionais e federais, organizações da sociedade civil, estudantes e organizações universitárias, sindicalistas e todos os cidadãos interessados em fortalecer os direitos políticos e eleitorais das mulheres.

Os principais OBJETIVOS propostos e alcançados foram os seguintes:

 O Primero.  Foram analisadas as experiências obtidas durante o Processo Eleitoral Comum Concorrente 2020-2021 com a aplicação, a partir do nível local, da legislação eleitoral e ações afirmativas relacionadas com a nomeação em paridade transversal de candidatos a cargos eleitos, seu impacto na integração de órgãos governamentais, o progresso alcançado e a detecção de áreas de oportunidade para maximizar o princípio da paridade transversal que favorece o empoderamento das mulheres em assuntos políticos. Deve-se notar que Freidenberg e Alva (2017:24) mencionam que a construção de regras do jogo que regulam as candidaturas no âmbito da igualdade de gênero, embora seja verdade que elas ajudam a romper as condições estruturadas entrincheiradas da cultura patriarcal, é apenas a ponta da história, por isso é necessário investigar outros fatores que impedem o o das mulheres a cargos públicos.

 Segundo. Foram estudadas as experiências reunidas durante o Processo Eleitoral Ordinário Concorrente 2020-2021 sobre violência política baseada em gênero contra as mulheres, o progresso feito para garantir às mulheres o exercício de seus direitos políticos e eleitorais livres de toda violência, bem como a identificação de áreas de oportunidade para a prevenção, combate e erradicação da violência política baseada em gênero. Sobre este tema, foram destacadas as ações afirmativas implementadas por cada instituto eleitoral local, assim como as dificuldades enfrentadas na sua aplicação e a resistência dentro e fora dos institutos. Como assinala Vásquez Muñoz (2021: 90), com a reforma de 13 de abril de 2020, o Estado mexicano alcançou progressos substanciais, mas ainda há necessidade de padronizá-lo em vários estados e harmonizá-lo nas diferentes instituições e órgãos públicos.

 Terceiro. Foram promovidas ações estratégicas para ter um marco legal federal e local que garanta, no futuro imediato, requisitos obrigatórios de elegibilidade, adequação e probidade para aqueles que ocupam cargos públicos nos poderes legislativo, executivo e judicial, assim como em órgãos públicos autônomos. Essas pessoas não devem ter um registro de denúncia, investigação, processo e/ou sentença executória por violência doméstica, não cumprimento das obrigações de apoio à criança, violência sexual e/ou violência baseada em gênero em qualquer de suas modalidades. A violência política contra as mulheres, em alguns casos, é uma extensão do que elas experimentam em casa, em suas relações conjugais ou em sua vida comunitária (Vargas e Palazuelos, 2019: 208).

 Quarto. O objetivo era promover a integração e colaboração de funcionárias públicas, especialistas e outras pessoas que participam ou estão interessadas em educação cívica, participação cidadã, construção da cidadania, democracia e processos político-eleitorais; com a intenção de incentivar o desenvolvimento de atividades educacionais, culturais, artísticas, científicas e tecnológicas no campo da educação cívica, participação cidadã e construção da cidadania, bem como estudo científico, análise legislativa, desenvolvimento organizacional de instituições, participação comunitária e especialização profissional nas mesmas áreas. Através da construção da cidadania, promove-se a equidade e igualdade de gênero no exercício dos direitos de todos os setores da sociedade, incluindo, de preferência, grupos em situações de vulnerabilidade. Neste sentido, Arjona Ordaz (2018: 146) aponta que a formação da cidadania foi deixada nas mãos de outros órgãos e que é uma prioridade treinar um cidadão que possa ser elegível para ocupar cargos governamentais e cargos eleitos. As mulheres, como membros da sociedade, devem participar ativamente da esfera pública, seja diretamente ou como representantes do público em geral.

E isso foi expresso em 8 de setembro de 2021. Mulheres mexicanas de diferentes entidades se reuniram novamente no primeiro Congresso Nacional de Mulheres Políticas. E não apenas comemoraram aquele mítico Primeiro Congresso Feminista, mas também debateram questões fundamentais para o pleno exercício de seus direitos políticos e eleitorais.

Para concluir

A presença da mulher mexicana no ambiente político é fundamental e busca com sua ação política ser aberta, a fim de consolidar a democracia no México. E no avanço social e no progresso,  as mulheres agora são mais livres, mais independentes e mais fortes, com uma vida produtiva pública digna e respeitada, consciente de seu grande e nobre papel na sociedade. Hoy mais do que nunca a presença das mulheres no bem social e no progresso coletivo, sente e triunfa. A paridade de gênero está sendo entendida e consolidada.

As mulheres fomos fortalecidas graças aos novos tempos que abriram inovações e melhores oportunidades para nós.  Essa luta não tem sido fácil, não foi curta. A luta das mulheres mexicanas para obter plenos direitos políticos tem sido muito a longo prazo com o objetivo inicial de romper este cerco de exclusão da vida política e pública, a fim de exercer plenamente o direito às cédulas livres e secretas, para serem consideradas como cidadãos de um país que estava em plena transformação política e social,  que tiveram que esperar o EUM para garantir seus direitos político-eleitorais como cidadãos. Levou mais uma década para abrir uma brecha entre os obstáculos que impedem o pleno exercício desses direitos, que ainda lutamos para erradicar hoje.

No   Congresso das Mulheres Políticas 2021, foi-se além.  Falou-se da participação das mulheres, não só no direito de voto e de ser votadas, mas também nessa participação da cidadania, que não consiste apenas em comparecer a uma urna para votar, mas é feita para exigir que as autoridades respeitem todos os direitos das mulheres; não se trata mais de obter doações, mas de pleno reconhecimento e garantia do exercício da cidadania. Foram feitos progressos nisso.

As mulheres unidas estão construindo  uma identidade de natureza política, compartilhando um objetivo comum a partir da  condição de gênero e nos integramos como um fator político determinante na vida política do país, com o peso que isso implica para as instituições de cada ente federativo como conselheiros eleitorais, magistradas, servidoras públicas, legisladoras, vereadoras, presidentas municipais, ativistas, membras de coletivos, mas sobretudo como cidadãs de um país que exige uma mudança nas condições das mulheres que  se reuniram no Teatro Peón Contreras e que participaram dos espaços virtuais para  exercer nossos direitos políticos e eleitorais livres de qualquer tipo de violência política de gênero.

Ser mulher não significa que temos opiniões e expectativas uniformes e idênticas.  Nas mulheres há uma grande diversidade de opiniões, projetos e ideais.  Todas nós trabalhamos em diferentes contextos em que o diálogo e o consenso devem ser privilegiados, e a fraternidade também deve ser incentivada, independentemente da diferença de opiniões ou ideais.  Como há 105 anos, os acordos que foram tomados nas mesas de trabalho terão um significado na agenda conjunta para a defesa das garantias e dos direitos políticos eleitorais das mulheres. A participação política das mulheres nos níveis nacional e subnacional foi refletida e transparece neste pacto reivindicado pelas mulheres políticas no México. Essas conclusões já foram apresentadas na Câmara dos Deputados e no Congresso do Estado de Yucatán.

O longo caminho percorrido na luta pelo reconhecimento dos direitos políticos das mulheres deu identidade e oportunidade de fazer história, ligando o grande exemplo de dedicação de inúmeros mexicanos por mais de cem anos, com o compromisso e convicção de abrir precedentes para que todas as mulheres desfrutem plenamente de todos os seus direitos fundamentais e político-eleitorais, construindo processos políticos significativos no México.

Bibliografia

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Arjona Ordaz, A. (2018). El reto de formar ciudadanía verdaderamente activa que participe en la solución de sus propios problemas y los de su comunidad. En IEPAC (Coord.) Ciudadanía y Educación Cívica. Ser y hacer de la Democracia. Mérida: IEPAC. 113-148.

Bareiro, L. y Soto, L. (2019). Representación Política de las Mujeres.  En D. Nohlen, L. Valdés y D. Zovatto (Comp.) Derecho Electoral Latinoamericano. México: FCE. 728-756.

Freidenberg, F. y Alva Huitrón, R. (2017). Las reglas impactan: impulsando la representación política de las mujeres desde las leyes electorales en perspectiva multinivel. En F. Freidenberg (Ed.) La representación política de las mujeres en México. México: UNAM. 45-81.

Rosado, Rosado G. (2018). La lucha de las mujeres por la democracia. En IEPAC (Coord.) Ciudadanía y Educación Cívica. Ser y hacer de la Democracia. Mérida: IEPAC. 173-198.

Vargas, G. y Palazuelos, S.G. (2019). Violencia política contra las mujeres: el precio de la paridad en México. México: MXP.

Vásquez Muñoz, T.C. (2021). La alianza interinstitucional en la armonización de los marcos legales y normativos con enfoque de género y erradicación de la violencia política en razón de género, en el año del Covid 19 en México. En A. Hipólito Durán y G.N. Morales Martínez (Coords.) Pandemia y nuevos paradigmas en la función pública y electoral”. Villahermosa: AMCEE. 81-92.